terça-feira, outubro 06, 2009

DA SANTIDADE PROFANA AO PROFANO SAGRADO

Sei muito bem que num primeiro momento esse título não parece plausível. As contradições que apresenta são em si mesmo sinais de que alguma coisa pouco ortodoxa se afigura.

A marca da santidade sempre se apresentou como distinção de tudo aquilo que permeie a esfera do profano, sendo que os dois termos até mesmo são auto-escludentes, não podem permanecer no mesmo espaço sob hipótese nenhuma. Por outro lado, tem-se por certo que na ótica da religião, tudo que for profano é essencialmente mal, ao contrário tudo de bom tem o selo do sagrado. Talvez numa atitude de revanche o materialismo, mesmo sem se ater aos termos supra, proclamou a superioridade do profano sobre o sagrado, decretando a nulidade da religião com seus símbolos e congêneres.

Pois bem proponho uma reconciliação, entre as partes, de forma a pensar numa santidade profana, e em seu reverso também na sagração do profano.

Inicialmente quero pensar nas muitas imagens criadas historicamente pelas religiões que divide o mundo em duas partes, o mundo material e o espiritual, e numa contribuição platônico-gnóstica, concebemos o mundo material como essencialmente mau e a realidade espiritual como eminentemente boa, daí, as muitas neuroses que se desenvolveram no meio religioso especialmente no cristianismo e em particular no evangelicalismo; devemos rejeitar tudo que não for material como mundano diabólico e pernicioso para a fé. O resultado foi que criamos pessoas esquizofrênicas, em conflito consigo mesmas, com o mundo em que vive, negando suas emoções reações e sentimentos, levados pelo medo de “agradar a carne”.

Creio firmemente que as coisas podem ser diferentes, que o mundo é um só e que espiritual e material são apenas convenções que utilizamos para distinguir a realidade material daquela que chamamos imaterial, e que elas não são boas ou más em si mesmas, chego a acreditar que elas são apenas meios onde a bondade e maldade se manifestam.

Outra importante expressão dessa deformação da realidade encontramos no conceito de coisas sagradas e profanas. Entende-se por sagrado, santo, santificado, etc. A idéia de coisas que receberam a visitação de seres divinos ou divinizados cuja manifestação conferiu determinadas qualidades transmissíveis aos fiéis. Nesse sentido temos lugares sagrados, pessoas santas e espaços sacros, objetos bentos, que não pode se misturar com a realidade profana que ao tocá-la pode conspurcá-la, poluindo a sua pureza.

Penso que sagrado e profano são dois lados de uma mesma moeda, seu reverso, de forma que o sagrado sem o profano se platoniza, se desencarna e existe apenas como realidade etérea, sem implicações na realidade concreta. Por outro lado, o profano que não se deixa nutrir pelo sagrado, também se torna estéril, sem vida e sem motivações. Proponho uma realidade na qual sagrado e profano se misture, como o fermento na massa, o resultado pode ser diferente, porém muito mais aconchegante. É a reconciliação entre dois extremos numa nova melodia, num novo poema, é o desnudar de um novo tempo.

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