quinta-feira, janeiro 29, 2009

Pastores-Pajés ou Curandeiros?Profetas ou Xamãs

Alguém pode se perguntar: O que estas figuras aparentemente tão distintas fazem juntas em um mesmo texto? Ou a despeito de que uma abordagem filo-teológica busca uma identidade entre eles?

Confesso que, embora historicamente exista afinidade quanto à atividade, isto é todos eles se encontram dentro da moldura de líderes religiosos dentro de determinado sistema político-cultural-religioso, no entanto, sempre guardaram entre si significativas diferenças, de forma que seria fácil distinguir um pastor de um pajé ou de um curandeiro e conseqüentemente, um profeta de um xamã.

Não ofereço aqui qualquer julgamento quanto à validade das crenças e das manifestações religiosas de tais líderes. Nem estabeleço aqui qualquer hierarquia valorativa entre eles. Reconheço seus valores e os tenho como significativos para a construção da espiritualidade de suas comunidades.

Atualmente, no entanto, parece que estas figuras vivem uma verdadeira simbiose, de forma que diversos elementos perfis e idéias que deveriam distingui-los deixaram de ser exclusivos e se encontram presentes na práxis religiosa de muitos líderes, que a despeito de se auto -intitularem “pastor”, se comportam como pajés ou curandeiros e muitos que adotaram o título de “profetas” na verdade manifestam comportamentos que nada tem a ver com o profetismo, são na verdade práticas típicas do xamanismo.

Vivemos na atualidade uma enorme confusão doutrinário-teológica, resultante da mistura provocada pela religiosidade pós moderna, onde já não é seguro afirmar quais são os elementos originais de determinado sistema religioso, político ou filosófico, isso parece ser algo comum a este tempo. Acontece que no caso específico da religião as conseqüências são muito maiores.

Atualmente ao ouvirmos determinadas pregações, não sabemos se estamos diante de um pastor ou de um pajé, munido de suas crenças e cerimoniais, lançando mão de incensos, negociando com espíritos que insistem em dominar os corpos dos seres humanos, provocando todo tipo de enfermidades e sofrimentos. A tarefa pastoral não se caracteriza por perseguir demônios, armados de esconjuros e bordões do tipo “ta repreendido”, “sai dele” e tantos outros largamente utilizados nos rituais de “expulsão de demônios”. Essa função é desempenhada com sucesso pelos curandeiros, feiticeiros e demais “guias espirituais” de qualquer tribo indígena.

A tarefa do pastor consiste em cuidar de pessoas, e não atuar como caçador de espíritos no melhor estilo dos caça fantasmas; acreditar em um mundo assombrado, dominado por forças malignas, não nos coloca muito longe das crenças verificadas nos círculos indígenas, e atribuir a espíritos malignos a responsabilidade por todos os males que se abate sobre as pessoas, não nos distingue de um curandeiro ou de um xamã.

Quanto aos profetas, estes não se caracterizaram por adivinhar o futuro, fazer prognósticos sobre o que vai acontecer e revelar os segredos das pessoas. Eles foram homens que assumiram compromisso com os problemas que afligiam as pessoas em suas relações sócio-político-econômicas, e reconheciam que os males não eram causados por forças cósmicas que conspiravam contra os indefesos mortais. Na verdade eles não tergivessaram, deram nomes e endereços aos verdadeiros responsáveis pela miséria e pelo sofrimento do seu povo, eles viram nas injustiças sociais do seu tempo, os reais demônios a serem exorcizados.

Se apegar a batalhas espirituais, combater um mal metafísico e se envolver em verdadeiras cruzadas contra espíritos etéreos, que supostamente espreitam as pessoas, e controlam os seus corpos e desprezar os “demônios” corporificados que todo dia semeiam o sofrimento a tristeza e a dor no mundo de forma clara e evidente, é deixar de ser profeta para assumir o lado xamã do ministério pastoral.

No entanto, é bom que se esclareça que não estou lançando descrédito sobre a a existência do mal, de espíritos ou qualquer outro elemento da crença religiosa evangélica ou não. O que questiono é a limitação da ação da Igreja, e por tabela dos seus ministros, a uma atuação desencarnada e platônica, o que a meu ver não se coaduna com a proposta do evangelho vivido e pregado por Jesus.

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quarta-feira, janeiro 28, 2009

Um Evangelho Tabajara

“E indo pregai dizendo o reino dos céus está próximo. Curai os enfermos, limpai os leprosos, ressuscitai os mortos, expulsai os demônios. De graça recebestes, de graça daí” (Mat. 10:7-8)

SEUS PROBLEMAS ACABARAM. Esta frase que identifica os produtos das Organizações Tabajara acaba de perder a sua exclusividade (talvez tenha sido pirateado) e já pode ser tranquilamente aplicada ao cristianismo moderno. Novos “princípios da prosperidade Bíblica” foram descobertos e agora você também já pode aprender e desfrutar, uma vez que é partilhado (ou vendido) a quem quiser.

Seus problemas acabaram: Você que sempre sonhou em ser rico, ter um iate, morar numa cobertura de frente para a praia, trocar de carro todo ano e viajar para onde quiser, agora você já pode. Qual é o seu problema? Dívidas a pagar? Cheque Especial no vermelho?, cartões de crédito atrasado?, hipoteca da casa?. Agora você não precisa mais se preocupar com essas coisas! “Pare de sofrer!”. Chegou o novíssimo e revolucionário Evangelho Tabajara. Dívidas canceladas, dinheiro que aparece na sua conta bancária, sonhos que se realizam desejos saciados como que por encanto. Só é pobre quem quer. A riqueza e a prosperidade agora se encontram a apenas um toque. Em apenas uma palestra você também aprende todos os segredos para fazer Deus atender aos seus caprichos, não importa quais sejam.

A lógica é simples: Deus possui um certo código secreto que uma vez decifrado, coloca o detentor do conhecimento no comando da história. Deus deixa de ser Senhor e passa a ser servo a serviço dos homens, até por que não é para isso que Deus existe?
Ser cristão na atualidade se tornou um grande negócio, aliás, onde mais você encontra uma crença que vem acompanhada da garantia de prosperidade? Vai-se longe os tempos em que o ideal da vida cristã estava voltado para o outro, para a prática do bem, nos moldes do samaritano (vai e faze a mesma coisa).

Atualmente, prega-se um evangelho Tabajara, pragmático, que vale pela sua funcionalidade, pelos resultados que proporciona e pelos lucros que garantem aos seus consumidores.
Atualmente, ao invés da Bíblia talvez seja mais sincero o uso do Código de Defesa do Consumidor. Já que se propala aos quatro ventos satisfação garantida, deve-se também acrescentar: “ou seu dinheiro de volta” (copiando o Actívia), já que a moda é copiar.

Vivemos um tempo de graça desvalorizada e de fé inflacionada (exercer a fé custa caro). Assistimos atualmente a pregação de um Deus Bonachão do tipo Papai Noel que concede benesses a alguns poucos iluminados que descobriram os segredos de Deus e agora vendem “colas” para quem desejar passar na prova sem precisar estudar.

Tal evangelho pressupõe uma visão mercadológica da fé, evangelho de consumo que se pode mercadejar, negociar nos balcões da vida, onde a palavra de ordem é desfrutar uma vida boa e confortável na qual os sofrimentos não existem.

O evangelho Tabajara prega uma Igreja parecida com um Shoping Center que existe para atender aos seus clientes, onde o que importa é que eles entrem e saiam satisfeitos, afinal o cliente sempre tem razão.

Além disso, este evangelho divulga um cristianismo R$ 1, 99, onde tudo é barato, em promoção e até mesmo em liquidação. Nesse feirão espiritual a regra é: quem dá mais, dou-lhe uma, dou-lhe duas, pagou levou. Leva mais quem oferece mais.

Esse tipo de evangelho se fundamenta numa fé chantagista, emocionalista característica da pregação pseudo-pentencostal, onde a ênfase NÃO ESTÁ NO SER E SIM NO TER. Mercadores de ilusões viajam pelo país vendendo sonhos (ou devaneios) e fantasias (ou alucinações coletivas) e caro, diga-se de passagem, para aqueles que querem ficar ricos, mas condenam a Mega Sena.
Essa teologia concebe a vida cristã como uma transação financeira com Deus, quanto maior a oferta maior a bênção. Assistimos hoje a mercantilização da fé conduzida por executivos do evangelho, que apresentam aos incautos, um Deus caricaturizado, nepotista e agiota que abençoa aqueles que podem dar mais e abandona os que não podem demonstrar sua fé por meio da oferta.

O que assistimos hoje é uma geração de pessoas frustradas com a fé, decepcionadas com a graça e desiludidos com a Igreja. A única forma de valorizar a graça de Deus é oferecê-la gratuitamente, uma vez que a graça não tem preço. Muito bem, façam suas apostas, a sorte está lançada, e quem sair por último por favor apague a luz.

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domingo, janeiro 25, 2009

EM BUSCA DE UMA ECLESIOLOGIA ENCARNADA

Possivelmente falar de uma encarnação da Igreja pode soar esquisito para muita gente, considerando que nenhum compêndio de teologia sistemática e ou ainda os melhores manuais sobre eclesiologia ensina qualquer coisa nesse sentido.

Muito bem, mesmo correndo o risco de ser mal interpretado ou não ser entendido, ouso dizer que nesse momento é exatamente disso que estou em busca.

Parece estranho que a teologia seja farta quando trata da encarnação do Logos na pessoa de Jesus e que a Igrejas tenha feito (e ainda faz) um esforço enorme para explicar o sentido e a razão dessa encarnação.

Hoje mais do que nunca eu entendo a encarnação. Descobri que ela não é um mistério como afirmaram os Pais Capadócios, na verdade ela é real, palpável e plenamente compreensível. Vejo a encarnação como a mais pura manifestação da graça, do amor e da misericórdia de Deus,(Deus se vez carne e habitou entre nós) lembrando que quando ele encarnou não havia lugar para ele.

Talvez o sentido dessa encarnação seja bem mais simples do que aquilo que emergiu dos longos e desgastantes debates sobre a encarnação que dominou a Igreja por séculos.

Para entender o sentido da encarnação, não precisamos discutir se Jesus tinha duas naturezas (diofisismo) ou apenas uma (monofisismo), se era ou não da mesma substância do Pai (homoousios) ou de substância semelhante (homoiousios). Além disso, o debate sobre a encarnação pode prescindir do conhecimento acerca das vontades de Jesus (se era uma ou duas). Se nele coexistiam duas ou apenas uma pessoa (pessona), nem interessa saber acerca da existência de “união hipostática” (hipóstases) entre a humanidade e a divindade de Jesus. Se Maria foi mãe de Deus (teotokos) ou apenas a mãe de Cristo (Cristotokos) A verdade é que ninguém “encarnou” Deus como Jesus o fez, a sua humanidade foi tão completa que nele Deus se tornou conhecido em toda a sua extensão.

Olhando para as escrituras, emerge do texto Paulino que a Igreja é o “Corpo de Cristo”, ora não nos parece paradoxal que este “corpo” esteja “desencarnado”, “espiritualizado” isto é que não exista uma teologia para a encarnação da Igreja?

Estou convencido que uma Igreja que não experimente a encarnação, não pode ser considerada como “Corpo”, uma vez que corpo é a expressão material do ser.

Penso na encarnação da Igreja, como a coisa mais urgente a se buscar na teologia e mais uma vez, relembro que tal encarnação nada tem a ver com a terminologia que embasou o discurso da Igreja sobre a encarnação do verbo.

Penso em uma Igreja encarnada nos moldes daquela encarnação que se manifestou em Jesus de Nazaré, que de forma plena exercitou sua humanidade. Penso em uma Igreja que seja Espiritual, sem deixar de ser humana que olhe para cima sem se esquecer da terra, onde a preocupação com o céu e inferno não seja motivo para esquecer as mazelas que afligem os homens aqui e agora. Que o discurso sobre o “pecado original”não faça a Igreja voltar os seus olhos para o passado, esquecendo que mais cruel que o “pecado de Adão” e o pecado da alienação, da indiferença para com aqueles que jazem ao nosso lado, nas ruas e até mesmo dentro das nossas comunidades.

Penso em uma Igreja encarnada, onde a adoração a Deus não seja desculpa para manter os cristãos enclausurados entre quatro paredes, inertes e apáticos, cantando como que para fugir da realidade, repetindo jargões que nada tem a ver com a realidade presente. A encarnação da Igreja deve lançá-la no mundo, é necessário que a Igreja se apaixone pelo mundo, não como o lugar da ação dos demônios e sim como o lugar onde o reino de Deus está sendo edificado. Uma Igreja encarnada tem os olhos abertos e o coração sensível para ser sinal de Deus em um mundo que sofre.

Sonho com uma Igreja com carne e osso cujo sangue corra nas veias da sociedade para oxigenar e trazer nova vida. Não como sal dentro do saleiro e como luz embaixo do alqueire, afinal ser sal e ser luz é um convite ao envolvimento (a luz não brilha em local iluminado) e o sal não pode salgar a si mesmo.

Penso em uma Igreja onde “ser diferente” não represente isolamento mais que assim como o “encarnado” seja fermento que misturado á massa promova o seu levedamento e que assim essa “massa” se torne pão, alimento para aquele que perece de fome. Que os problemas sociais de hoje e não apenas as histórias do passado sejam temas para as mensagens de domingo

Lembremos que os “sãos” não necessitam de médicos, (nem de remédios) e que a encarnação do verbo é um sinal de que não se pode servir a Deus a não ser servindo ao próximo.

Penso em uma Igreja encarnada, onde a pureza não seja um sinal de exclusão. Uma Igreja Encarnada pode ser comparada a um hospital para onde os doentes são levados (e onde permanecem) na esperança da restauração. Que o desejo de ser “levitas” e “sacerdotes” não torne a Igreja indiferente ao sofrimento do outro, mas que possamos preferir (contrariando a visão mais conservadora) ser uma Igreja “samaritana” que acolha o alquebrado concedendo-lhe conforto e alento.

Acredito na encarnação da Igreja como um remédio para o distanciamento entre Deus e os homens, que Deus não seja conhecido apenas pela doutrina e pelos sermões pregados acerca do que Deus fez no passado, nos milagres e sinais. Aprendemos que o “encarnado” pouco falou sobre Deus no entanto, suas ações mostraram a face do pai transfigurada na sua. Uma Igreja encarnada não precisará falar de Deus, ele será tão real que todos o conhecerão, como vaticina o profeta Jeremias no cap. 31:34 "E não ensinarão mais cada um a seu próximo dizendo: Conhecei o Senhor ; por que todos me conhecerão..."

Acredito que Deus não será conhecido por meio de teorias sobre revelação, inspiração, iluminação ou qualquer outra doutrina da teologia sistemática. Confesso que cada vez que busco explicações nesses compêndios doutrinários, parece que Deus se oculta (de propósito) levando nos a pensar que a verdadeira revelação de Deus se dá na práxis da Igreja, no toque, no sorriso, na palavra de consolo. Que a verdadeira teofania está na face do outro e que sagrado é o gesto de aceitação.

Uma Igreja Encarnada consegue conjugar santidade e humanidade no mesmo projeto, sem a neurose agostiniana de ver o material como algo essencialmente mal, ela entende o corpo como belo, e santo, aceita que a vida é um dom de Deus para ser experienciado aqui e agora, que não dá para ser feliz, apenas com a espectativa de uma vida futura. Que é aqui neste mundo onde nascemos e vivemos que somos chamados a nos realizarmos como pessoa(e depois dela também).

Uma Igreja que se encarna pode sentar-se à mesa com os pecadores sem medo de se contaminar, acolher os pobres, os marginalizados e excluídos, sem que para isso tenha que desprezar os ricos e até mesmo os opressores, por que a melhor forma de socorrer os oprimidos é pela transformação dos opressores; afinal, eles também são alvos da graça e da misericórdia de Deus. Se quisermos um exemplo, devemos olhar para a experiência de Zaqueu com o encarnado. Jesus não organizou um movimento de “denúncia” contra Zaqueu, ele não se negou a “se misturar” com ele, sob o pretexto de que “a luz não se mistura com as trevas”, então o que ele fez? Ele foi à sua casa, comeu com ele, e não sabemos se falou alguma coisa acerca dos seus erros e pecados, no entanto, nenhuma mensagem foi tão eficaz como aquela; Jesus libertou a muitos da exploração de Zaqueu, exatamente porque, naquele dia o explorador foi derrotado, conquistado e morto, e, em seu lugar nasceu um novo homem, disposto não apenas a não mais extorquir como a repartir o que possuía.

Não estou dizendo que conheço esta Igreja, embora seja possível que ela já exista como protótipo, como embrião, como gravidez. Sonho porém com o dia em que em algum lugarejo, desse mundo em algum lugar no futuro essa Igreja nasça, talvez em uma manjedoura, seja pobre diferentemente da rica e poderosa Igreja do presente, que não tenha tanto poder como aquela que ora se faz propalar pelos quatros cantos da terra, ela será no entanto, sinal de graça, de misericórdia, capaz de acolher em seu seio os pecadores, os fracos, maus e destituídos de valores. Temo porém que a exemplo do “encarnado de Nazaré” quando esta Igreja chegar não haja lugar para ela e que de certa forma ela também seja incompreendida, criticada, perseguida e finalmente crucificada e morta pelos guardiões da fé da sã doutrina. Nesse dia mais uma vez será necessário recordar uma voz que soa: “perdoa-lhes, eles não sabem o que fazem” !!

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sábado, janeiro 24, 2009

Crepúsculo do Fundamentalismo Religioso (Preâmbulo para uma teologia iconoclasta)

RECENTEMENTE EU VENHO REFLETINDO sobre o discurso de alguns radiopregadores contemporâneos, e não dá para negar que nos encontramos diante de uma verdadeira ditadura religiosa, travestida de zelo doutrinário. Trata-se do surgimento de uma vertente do evangelicalismo brasileiro, que didaticamente denomino como “construtores de fardos” são pessoas que possuem uma queda especial pelo legalismo, pela fantasia, pelo fanatismo e pela ilusão. Esse movimento prega uma espécie de farisaísmo evangélico e seus adeptos se parecem mais com discípulos de João Batista do que seguidores de Jesus.

Conforme sabemos, João era um personagem singular no contexto do primeiro século; tinha problemas com roupas (só usava roupa de pelos de camelo e cinto de couro) era rigoroso em matéria de alimentação (só comia gafanhotos e mel silvestre), tinha tendências ao ascetismo rigoroso (morava no deserto, pregava o jejum e era celibatário); era abstêmio (não bebia vinho ou outra bebida). João era exatamente o inverso de Jesus, que era chamado de comilão e beberrão, vivia na cidade, se vestia como todo mundo, não era fanático por jejuns e era visto participando de festas e banquetes, sem nenhuma culpa ou pecado.

Não é segredo que o cristianismo, especialmente a sua versão fundamentalista, possui uma queda por fardos religiosos, parece ser inerente à sua natureza; a imagem do peregrino de John Bunian com um fardo nas costas ilustra bem esse quadro. Historicamente, o fundamentalismo construiu uma verdadeira fábrica de fardos e uma vez que eles estão prontos, são atados nas costas daqueles que inadvertidamente se submetem aos caprichos de líderes doentes, neuróticos, que confundem espiritualidade com rigor religioso, obediência com legalismo e cuja maior satisfação é acrescentar a cada dia novos pesos, novas exigências que aumentam ainda mais o tamanho desses fardos, tornando a caminhada religiosa, uma cansativa e penosa viagem, na qual é necessário se privar de todos os “prazeres do mundo”, e se apegar a jejuns prolongados, abstinência de tudo e a todo tipo de renúncia, como forma de obtenção de bênçãos espirituais.

Além disso, o fundamentalismo estabelece como padrão para todos, um estilo de vida marcado pelo rigorismo digno de um monge cenobita para dessa forma ganhar uma recompensa após a morte. Nesse sentido, é imposto ao fiel negar o aqui e o agora, a abrir mão da realidade na qual está inserido, para ter a garantia do gozo futuro na eternidade. Não sem razão, se verifica hoje um certo cansaço em relação a esse modelo de cristianismo, ele nega a natureza humana da igreja, rejeita tudo que é material e se espiritualiza. Esse modelo cristão-maniqueísta despreza afinal aquilo que diferentemente dos demais animais, caracteriza o ser humano que é exatamente a busca pela realização, pela satisfação do desejo o anelo pela realização dos sonhos, que nesse caso soa como absolutamente contrário à espiritualidade.

Nesse ambiente, o prazer é relegado como satânico, pecaminoso, imoral, ilegal e, portanto, incompatível com a “santidade” daqueles que se propõem a “seguir a vontade de Deus”. Prega-se um Deus incompreensível, esquizofrênico, que não harmoniza com a sua criação, afinal, não dá para entender que Deus tenha criado o homem dotado de desejos que efetivamente não podem ser satisfeitos.

Estou convencido de que este fardo religioso é absolutamente contrário ao princípio do evangelho, cuja característica é a plena libertação de todo tipo de correntes e amarras da religiosidade. Para os Fariseus que insistiam em enquadrar Jesus no rigorismo excessivo da religião e a obrigá-lo a tomar um fardo religioso sobre seus ombros ele foi enfático: “Conhecereis a verdade e a verdade vos libertará”. Mais do que nunca precisamos re-pensar a práxis da igreja, que muitas vezes se torna castradora, repressora, dominadora e, ao invés de produzir o alento, o alívio e o descanso, dedica-se a produzir fardos e a primeira coisa que o novo convertido recebe ao chegar na Igreja é um saco para colocar as neuroses e patologias que passa a receber; dessa forma não é de se estranhar que na atualidade, a igreja tenha perdido a sua relevância e já se verifique um certo desalento em relação à religião enquanto instituição religiosa.

Confesso que como a maioria dos cristãos eu já carreguei esse fardo, considerava que fazia parte das obrigações de todos os que seguem a carreira cristã. No entanto, atualmente tenho tomado algumas decisões sobre fardos religiosos e acho que posso resumi-las assim:

  1. Não carrego mais esse fardo, entendo que ele não contribui em nada para melhorar o que somos, entendo que o principal papel do evangelho (e por tabela, da Igreja também) é tornar o homem melhor, nos humanizar, nos libertar das mazelas do egoísmo, da indiferença em relação à dor do outro, e nos levar para fora de nós mesmo, promover a alteridade como sinal do amor de Deus. Entendo que carregar um fardo religioso, promove o anti-evangelho, pois reduz a nossa visão ao campo de atuação da religião, nos endurece, nos torna arrogantes e intragáveis (quanto maior o fardo, maior o “orgulho santo”): passamos a nos preocupar com as filigranas da religiosidade e perdemos de vista a dimensão divina, esquecemos que a única forma de amar e servir a Deus é no outro, no qual Deus se encontra de forma anônima.
  2. Não mais ajudarei na tarefa de produzir fardos religiosos, nem alimentarei a sua existência, ao contrário: direi de antemão que você também não precisa de um fardo para seguir a cristo. Sei também que muitos possuem seus “fardos de estimação”, estão viciados, dependentes deles é já não conseguem viver sem eles, no entanto, estou convencido que a vida cristã não precisa ser vivida um eterno rolar pedra ladeira acima, uma verdadeira síndrome de Sísifo. Estou convencido de que as palavras de Jesus “vinde a mim todos os cansados e sobrecarregados” nunca foram tão atuais, afinal ele falava para pessoas religiosas, que gemiam sob o peso da religiosidade farisaica, para este ele disse “eu vos aliviarei”. Não sei você, mas eu já decidi o seguinte: Abandonei o fardo religioso que me foi imposto no passado. Ele não mais me pertence ou interessa. Deixei junto a ele um aviso escrito em letras garrafais: “PONTO DE COLETA: DEIXE AQUI O SEU FARDO RELIGIOSO. Vejamos o que acontece.

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sexta-feira, janeiro 23, 2009

PREFIRO ANDAR NA CONTRAMÃO

"É tão arriscado acreditar em tudo como não acreditar em nada" (Diderot)

Conheço o Código de Transito Brasileiro e os perigos de andar na contramão, cuja principal possibilidade é a de provocar uma colisão. Sei também que o bom senso não recomenda que se haja dessa maneira, principalmente quando a maioria quase absoluta concorda que o sentido oposto em que estamos transitando é o caminho certo e a única direção a seguir. E mais, a menos que o motorista seja um suicida eu também não recomendo tal procedimento.

No entanto, em se tratando dos rumos da Igreja Evangélica no Brasil (ou pelo menos parcela dela) eu não vejo outra opção. È seguir com a maioria, nessa verdadeira corrida maluca, ou a andar na contramão.

Talvez seja hora de perguntar quem está na contramão? Será que a mão não foi invertida e a Igreja atualmente insiste em seguir em frente, apesar dos insistentes avisos encontrados pelo caminho?

Prefiro andar na contramão, a seguir em frente na maioria das idéias pregadas e defendidas em nosso tempo. Sei que possivelmente isso implicará em choques, com aqueles que consideram que existe apenas um caminho certo, que cristalizaram suas idéias e não admitem discuti-las. Gostaria de apresentar algumas estradas nas as quais já não já não consigo mais seguir.

Prefiro andar na contramão dessa "Teologia Curupira" que muitos dos nossos líderes insistem em pregar. Chamo "Teologia Curupira", a tendência quase que obstinada de manter os pés para trás e os olhos no passado. È sempre a mesma coisa, toda vez que alguém levanta um problema, a primeira coisa que se faz é voltar os olhos para o passado, a algum texto bíblico e de lá não se consegue mais sair. Essa visão teológica fundada apenas nas experiências passadas, que não se contextualiza, já não consegue responder aos reais problemas que afligem ao homem do presente. Sabemos que a teologia não pode ser estática,

Prefiro pensar uma teologia que ande para frente e olhe para o futuro, que contemple o presente. Creio que Deus não tem compromisso com o passado, as experiências de ontem não obrigam Deus a agir da mesma forma. Estou cansado de ouvir pregações afirmando que "assim como foi com fulano assim será com você". Creio firmemente que Deus age de acordo com a sua vontade e acho temerário afirmar que as coisas vão se repetir tal qual aconteceu no passado.

Algumas perguntas que insistimos em responder já não trazem qualquer contribuição para aqueles que ouvem. Tais como: "As 7 semanas de Daniel", o significado da "agulha e do camelo" Como é o céu? Para onde vão as almas depois da morte? Questões sobre as quais até hoje ninguém conseguiu ser convincente ao tentar responder tais perguntas.

Prefiro a contramão a seguir com aqueles que insistem em fazer da vida cristã um mundo de faz de contas, criando ilusões, castelos de areia, negando a realidade e pregando um Deus manipulável. Já não acredito que seja possível "mover" Deus por meio de jejuns, sacrifícios pessoais, que existam formulas para fazer as coisas acontecerem. Não consigo pensar nesse Deus marionete, que atende aos comandos daqueles que se utilizam de "métodos infalíveis" que podem inclusive ser ensinados e reproduzidos por outras pessoas. Já não acredito que o mundo seja mecânico, onde as coisas "funcionam assim", prefiro aceitar a dúvida à certeza que tudo já está predeterminado, estou convencido de que o elemento central da fé não é a certeza e sim a esperança, sim porque a certeza nos torna estáticos e arrogantes, enquanto que a esperança nos mostra onde estamos e nos estimula a contunuar andando. Prefiro a expectativa do futuro, daquilo que ainda não é ao imobilismo da pregação escatológica, que insiste em afirmar que tudo já está decidido pelos desígnios divino e que portanto nada podemos fazer para mudar. Nesse sentido acredito que Raul Seixas tem mais a dizer que muitos pregadores atuais quando afirma "prefiro ser essa metamorfose ambulante do que ter aquela velha opinião formada sobre tudo". Prefiro a utopia, o ainda não, o "devir", pois conforme atesta Eduardo Galeano:.

"A utopia está lá no horizonte. Me aproximo dois passos, ela se afasta dois passos. Caminho dez passos e o horizonte corre dez passos. Por mais que eu caminhe, jamais alcançarei. Para que serve a utopia? Serve para isso: para que eu não deixe de caminhar".

Prefiro caminhar contra a multidão a acreditar que tudo que for material, humano e prazeroso pertence ao diabo. Já não aceito a idéia platônica/agostiniana/maniqueísta de que as coisas boas são espirituais e as materiais são ruins. Vou na contramão e digo que tanto o material como o espiritual pertencem a Deus e se todas as coisas foram criadas por ele, são boas, que o Deus não condena o prazer, alegria e a felicidade, porque ele também é o autor das emoções e dos sentimentos .

Prefiro andar na contramão daqueles que professam a idéia do casamento indissolúvel, e do divórcio como pecado. Não pretendo fazer uma apologia ao divórcio e à dissolução do casamento e das famílias. No entanto, já não dá para se tratar tal instituto apenas com base na concepção judaica sobre o casamento. O que fazer quando os relacionamentos se deterioram e passam a produzir apenas sofrimento? Creio ser preferível um divórcio sincero a um casamento de fachada. Manter as pessoas juntas apenas para dar satisfação à Igreja e à sociedade, não parece razoável.

Já não agüento a hipocrisia daqueles que baseados em seus relacionamentos querem fazer regra para todo mundo com frases moralistas do tipo "tenho tantos anos de casado com a mesma mulher" ou com o mesmo homem fazendo disso regra para todo mundo. Tais exemplos via de regra são fornecidos por pessoas que vivem relacionamentos estáveis, (amém por isso), jamais enfrentaram uma crise conjugal e por isso não sabe exatamente o que significa enfrentar o problema. Além disso, cada caso é um caso. Existem crises que são superáveis e outras que não. Impor às pessoas permanecerem presas a um relacionamento que já não existe, é prolongar um sofrimento desnecessário e atentar contra a liberdade das pessoas. È negar que as pessoas podem se equivocar na escolha de seus cônjuges como se equivoca em tantas outras escolhas da vida. Não creio nessa baboseira de "se você escolheu errado pague o preço" Deus não aprova esse tipo de radicalismo quer seja ele na esfera espiritual, conjugal ou qualquer outra.

Depois de ler este texto, você também poderá decidir que caminho seguir, Talvez não seja prudente caminhar na contramão, sendo mais confortável seguir em frente com a multidão; bem nesse caso, vamos ver aonde este caminho levará a igreja brasileira. De qualquer forma, eu já tomei minha decisão: prefiro a contramão da realidade ainda que dura, a seguir o caminho da ilusão, da fantasia que insiste em seguir em frente sem olhar as placas que indicam que existe alguma coisa errada com este caminho.

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quinta-feira, janeiro 22, 2009

A Rede, o Hospital e o Centro Cirúrugico - Repensando a Disciplina na Igreja

QUEM SOMOS NÓS? PESCADORES OU CIRURGIÕES? Qual é a natureza da Igreja? Rede, Hospital ou Centro Cirúrgico?

As perguntas acima se justificam. Atuando como examinador de teologia em diversos concílios, toda vez que questiono acerca da disciplina na Igreja, recebo sempre a mesma resposta. “Existem três tipos de disciplinas: a formativa, a corretiva e a cirúrgica” Alguns as nomeiam de forma diferente e outros apresentam listas maiores com quatro ou cinco formas de disciplinas. Porém, todas elas terminam da mesma forma com a tal “disciplina cirúrgica”, que nada mais é que o afastamento, a segregação, ou seja: A exclusão sumária daqueles que transgrediram as normas e as doutrinas da Igreja.

Sei que muitos dirão: Qualquer manual de eclesiologia vai acatar esta tese e mais: A Bíblia também ensina dessa forma.

Não desconheço essas coisas, e eu mesmo já ensinei e até realizei essa “cirurgia”, e conheço pastores que são “especialistas” verdadeiros “cirurgiões”, que de posse do bisturi, vai livrando o corpo (Igreja) dos “tumores malignos”, das “maçãs podres”, dos “pecadores” que não podem permanecer com os “santos”, “puros” e “imaculados”.

No entanto, olhando à luz do evangelho, e da natureza da Igreja, não veja base para continuar afirmando a existência de tal disciplina. Vejo a Igreja como um Hospital (lugar de restauração, de cura e para onde se leva os doentes e onde permanecem os pacientes terminais) e não como um “Centro Cirúrgico” (lugar de cortar, extirpar os membros doentes). Se o Hospital expulsar os doentes, onde mais eles terão chance de cura? Jesus foi enfático: “Os sãos não necessitam de médicos”. É fácil para a Igreja cuidar apenas dos saudáveis, dos “atletas espirituais”, o desafio é cuidar dos enfermos e acreditar que eles podem se recuperar.

Quero desafiá-lo a olhar além da Teologia Sistemática e dos manuais de eclesiologia na busca de uma nova compreensão sobre este assunto tão crucial para a vida da Igreja. Depois de analisar a matéria, cheguei a algumas conclusões que humildemente compartilho com você:

QUAL A BASE DA DISCIPLINA CIRÚRGICA?

Muitas das idéias que professamos e defendemos muitas vezes são absolutamente estranhas ao cristianismo em suas origens. A Bíblia não faz menção a qualquer classificação disciplinar. Os Pais Apostólicos, especialmente a Didaquê se encarregaram de formular regras para serem aplicadas na vida da Igreja, dando início à formalização do moralismo cristão, guindando a necessidade de “testemunho” acima da prática do amor e da misericórdia. O cisma de Novaciano e a crise de Cipriano, tiveram origem no mesmo problema qual seja: O que fazer com os “caídos”, se poderiam ou não ser readmitidos à comunhão da Igreja.

A nossa Herança teológica, no entanto, tem suas origens no Puritanismo que se desenvolveu na Inglaterra, se instalando posteriormente nos Estados Unidos nos Séc. XVII e XVIII e que influenciou a Igreja protestante emergente, especialmente os Presbiterianos, Batistas e Congregacionais e cuja doutrina fundamentalista é sinônimo de rigidez moral e intolerância religiosa. Nesse contexto, se desenvolveu a idéia de “Igreja pura”, cuja principal porta de entrada é o batismo e cujas portas de saída, a carta de transferência, a compulsória (alguns admitem, outros não), a morte e a exclusão.

Muito bem, nesse modelo, a Igreja é formada pelos “santos”, pelos “puros” “lavados e remidos no sangue de Cristo”, pessoas que “morreram para o mundo”, etc. Nessa Igreja não há lugar para os imperfeitos, para “pecadores e publicanos”. Toda essa visão eclesiológica foi forjada nesse contexto e já não faz tanto sentido nos dias atuais.

Acredito, porém que mais do que tudo isso, a base teológica dessa doutrina se encontra numa hermenêutica equivocada de Mateus 18:15-22.

Algumas observações simples nos levam a entender que o texto não fornece qualquer base para a famigerada “disciplina cirúrgica”, uma vez que nem mesmo faz referência a qualquer disciplina no sentido moderno da palavra. A palavra chave que norteia este texto é “ganhar o irmão” e o contexto nos leva ao desafio de perdoar até setenta vezes sete. Veja bem, estamos falando do mesmo texto. Durante toda a instrução, busca-se ganhar/restabelecer o irmão e não extirpa-lo/amputá-lo como se fosse um membro gangrenado para o qual já não resta qualquer esperança.

Ao final de todas as tentativas realizadas, o texto conclui com a sentença “considera-o como publicano e pecador”. Muito bem, que tipo de atitude o texto está recomendando? A exclusão? Creio que não. Precisamos olhar para o texto sem os condicionantes adquiridos por anos de repetições doutrinárias e refletir sobre o seu real significado. Não se pode esquecer que a forma como ouvimos este texto soar fará muita diferença em nossa compreensão e na definição de seu real significado.

Em primeiro lugar, não consigo imaginar que as palavras “publicano e pecador” possam soar da boca de Jesus em termos pejorativos. Jesus jamais se referiu a quem quer que seja de forma preconceituosa. Talvez o som dessas palavras seja mais doce do que jamais imaginamos ouvir, tal como: “considera como se estivesse tratando com alguém que precisa ser ganho pela primeira vez”. Jesus não rejeitou os publicanos nem os pecadores, nem nos ensinou a proceder assim. Pergunta-se: qual deve ser o procedimento da Igreja para com os pecadores (já que não temos publicanos hoje)? Nesse sentido verificamos aquilo que talvez seja a maior das incongruências da Igreja: a Igreja diz que devemos “amar os pecadores”, que devemos “busca-los”, no entanto, parece que existem dois tipos de pecadores, os de fora e os de dentro. O que fazer com estes? Os de fora a Igreja coloca para dentro e os de dentro ela coloca para fora.

EM SEGUNDO LUGAR precisamos refletir acerca da natureza da Igreja para que possamos cumprir a orientação bíblica. Jesus falou do reino como uma “rede”, que ao ser arrastada apanha todo tipo de peixe e continua sendo arrastada até chegar à praia, onde será feita a separação entre bons e maus. A verdade é que ainda não chegamos à praia, e até lá precisamos ter paciência para esperar que os peixes ruins (isto é pequenos, imprestáveis para serem comercializados) cresçam. Ruim aqui não denota a qualidade do peixe e sim o estágio em que se encontra. Jogar o peixe pequeno fora da rede não é atribuição do pescador, segundo o texto será dos anjos.

Além disso, Jesus também se referiu ao reino em termos de “joio e trigo”. Precisamos de uma Igreja que a despeito de tudo que aprendemos até hoje, aceite deixar o joio e o trigo crescerem juntos. Eu sei que nossa primeira atitude (a exemplo dos homens da parábola) é arrancar o joio, para “limpar” o trigo. Sei também que muitos dirão: “A Igreja não pode ser conivente com o pecado”. Sei ainda que é uma tarefa difícil, espinhosa e dolorosa, no entanto, quem disse que teria que ser assim não fui eu. A segunda coisa importante é que a convivência com o joio não fará o trigo deixar de ser trigo, a Igreja é fermento e precisa aceitar a convivência com a massa, a fim de poder levedá-la.

Estou convencido que a doutrina da “disciplina cirúrgica”, não se harmoniza com o ensino exarado em João 6:37. “Todo aquele que o Pai me dá virá a mim, e o que vem a mim de maneira nenhuma o lançarei fora”. Sei que muitas questões de ordem exegéticas podem ser levantadas aqui, no entanto, creio que a expressão “de maneira nenhuma” dispensa maiores comentários.

Assim, já não vejo razão para que possamos continuar a dizer que a Bíblia autoriza a Igreja a fazer uso do bisturi, a jogar os peixes pequenos fora e a arrancar o joio. Nas palavras de Jesus, “Deixai crescer ambos juntos até a ceifa” (Mat. 13:30).

Estou convencido que a nossa capacidade de discernir entre o trigo e o joio, entre peixe ruim e peixe bom, entre membro que pode ser curado e membro gangrenado, nos impossibilita de procedermos assim. Deixemos que Deus que tudo conhece se encarregue de “limpar” a Igreja, separar o trigo do joio, e fazer as “cirurgias”, se assim Ele quiser. Só assim, evitaremos o “erro médico” de primeiro operar e depois pedir o exame.

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segunda-feira, janeiro 05, 2009

Um Mundo sem Religiões

SEI QUE PARECE ESQUISITO, mas recentemente eu venho pensando nessa possibilidade. Sei também que muitos poderão achar que pensar desta forma é jogar na defesa e fazer gol contra. No entanto depois de algumas reflexões é possível que você também venha a pensar como eu.

Recentemente me encantei com a leitura do livro Religião e Repressão do teólogo brasileiro Rubem Alves. Confesso que algumas afirmações ali contidas me marcaram profundamente e me fizeram re-pensar algumas verdades que me negava a admitir.

Quero compartilhar com você algumas dessas conclusões contidas, nesse texto e desafiar você a refletir sobre elas:

Assegura Alves:

“Deus dá nostalgia pelo vôo.

As religiões constroem gaiolas.

Quando o vôo se transforma em gaiolas, isso é idolatria”.

Não pude deixar também de pensar nas palavras de Jesus: “Em vão me adoram ensinado doutrinas que são preceitos de homens” (Mc. 7.7) O que será que ele estava criticando naquele momento? Como reconhecer uma “doutrina” que seja ou não “preceito humano”, Sabemos, porém que a vocação das religiões é construir e preservar. doutrinas

Diante dessas inquietações, comecei a pensar na possibilidade de um mundo sem religiões.

Obviamente que não estou levantando dúvida sobre a validade da religião como fenômeno, como manifestação de uma espiritualidade sadia. No entanto, não posso negar que as religiões enquanto instituições se transformaram em gaiolas que buscam prender o pássaro da espiritualidade proclamando ainda que ele só pode ser encontrado dentro delas.

Verdade é que a religião tem vocação natural para a proibição, para construir e preservar os tabus, dentro dela não existe lugar para a liberdade e para o vôo. “Prisioneiro, dize-me quem foi que fez essa inquebrantável corrente que te prende? “(pergunta Tagore) Fui eu disse o prisioneiro fui eu que forjei com cuidado esta corrente”.

Toda vez que o “pássaro” se nega a cantar dentro da gaiola e começa a cantar de forma diferente, que o prisioneiro resolve quebrar as correntes, é logo acusado de rebeldia e rotulado de herege, afinal pássaro bom é pássaro adestrado.

Sempre pensei a religião como algo libertador, mas quando olho os sistemas religiosos que atualmente se multiplicam no mundo, suas múltiplas regras normas e proibições, fico a pensar se às vezes esta pretensa liberdade não se traduz em prisão.

Em “Os irmãos Karamázovi”, no relato sobre o Grande Inquisidor, Dostoiévski escreveu: “Não há nada mais sedutor aos olhos dos homens do que a liberdade de consciência, mas também não há nada mais terrível”. As correntes, algemas e grilhões forjados pela religião impedem que a experiência religiosa se torne um vôo nostálgico e se transforma em uma caminhada penosa. Deixa de ser a manifestação prazerosa da experiência com o sagrado e se torna a cega observância de regras, normas, dogmas e doutrinas, ou seja: a religião passa a escravizar o homem, alimentando-o com a ilusão de que é melhor a segurança da gaiola que a incerteza da liberdade.

Na verdade, as religiões acreditam ter o monopólio da experiência religiosa, de forma que a única forma de liberdade possível é dentro das gaiolas da religião. Nas palavras de Rubem Alves: “As religiões são instituições que pretendem haver colocado numa gaiola o pássaro encantado”

Fiquei pensando: Como seria um mundo sem religião? Sem gaiolas nem correntes! Sei muito bem que o mundo não se transformaria em um utópico Éden na terra, porém vislumbro algumas realidades que poderiam mudar.

Creio que um mundo sem religiões, nos proporcionaria a superação do DOGMATISMO, sabemos que a religião se funda no dogma, na certeza ainda que irracional de que determinada verdade não comporta questionamentos, o dogma representa a mordaça da liberdade religiosa, ela mata a liberdade de consciência, e impede o desvelar de novas compreensões sobre o fenômeno religioso.

Além disso, um mundo sem religiões nos conduziriam pelo caminho para vencer a INTOLERÂNCIA religiosa. Sei muito bem que a religião não é a única responsável pelas manifestações de intolerância na sociedade. Não se pode negar, porém que ela ainda representa o principal foco, as pessoas são inflexíveis e impiedosas na defesa das suas convicções religiosas, talvez motivado por uma intenção sincera, os resultados, porém não precisamos citar aqui, a história é testemunha de que em nome de Deus e em defesa das religiões, muito sangue foi derramado, muita lágrima vertida e a dor semeada em abundância.

Acredito ainda que um mundo destituído das religiões enfim nos proporcionasse o fim dos movimentos FUNDAMENTALISTAS religiosos, a exemplo do Taliban, dos Xiitas, Ku Klux Klan, que serviu para garantir o domínio dos protestantes brancos sobre negros, católicos, judeus e asiáticos dos Estados Unidos.

Creio que um mundo sem religiões nos pouparia do radicalismo e do Legalismo que caracteriza o fanatismo religioso capazes de tudo na defesa intransigente da fé.

Talvez tenha sido pensando assim que o teólogo contemporâneo Dietrich Bonhoeffer idealizou um “Cristianismo sem religião” e Karl Barth a falar do “caráter diabólico da religião”

Penso que um mundo sem religiões, porém, com fraternidade, sem instituições religiosas, porém sensível aos reais problemas que afligem a humanidade, que proporcionasse aos homens uma convivência pacífica e respeitosa, talvez seja um sonho, uma utopia. Más acredite: Eu trocaria todas as religiões do planeta por um mundo assim.

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