quinta-feira, junho 30, 2011

IMAGINE... QUE NÃO HÁ RELIGIÕES!

A religião é vista pelas pessoas comuns como verdadeira, pelos inteligentes como falsa, e pelos governantes como útil." (Sêneca)

Já faz algum tempo, que em uma das minhas crises, escrevi um texto que intitulei de “UM MUNDO SEM RELIGIÕES”. Atualmente, diante dos últimos acontecimentos envolvendo a igreja brasileira, o recrudescimento dos conflitos religiosos no mundo e revendo esse texto, chego a pensar que apesar de ilusório, um mundo sem religiões pode ser um sonho que talvez valha a pena perseguir. Sei também que assim como eu, apesar de não admitir, muita gente também pensar assim. Na canção “Imagine” John Lennon ousou pensar em um mundo diferente e nos desafiou: “... imagine que não existam países, nada pelo que matar ou morrer, e nem religiões também...”. Em outras palavras um mundo menos institucionalizado, já que grande parte das mazelas do mundo é produto das instituições.

Jesus talvez seja o maior exemplo de que é possível viver em um mundo sem religião. Apesar de profundamente espiritual[1], ele não centrou a sua caminhada na observância de preceitos religiosos; não escreveu livros sagrados, não prescreveu doutrinas nem criou nenhuma religião. De certa forma, ele foi um iconoclasta, pois, em sua maneira de viver quebrou diversos preceitos fundamentais da religiosidade de seu tempo, tais como: aqueles ligados a purificação: perguntaram a ele: “Por que transgridem os teus discípulos a tradição dos anciãos? Pois não lavam as mãos quando comem pão” (Mateus 15: 2) Ele responde “O que contamina o homem não é o que entra na boca, mas o que sai da boca isso é o que contamina o homem” (Mat. 15;11); a Lei relativa à observância do sábado: os fariseus perguntaram a Jesus: “Por que fazem no sábado o que não é lícito?” (Mc 2:24) e Ele responde: “O Sábado foi feito por causa do homem, e não o homem por causa do Sábado.” Mc 2:27; da obrigatoriedade do jejum: perguntaram a Jesus: “Por que os discípulos de João e os discípulos dos fariseus jejuam, e os teus discípulos não jejuam?”; então ele respondeu: “Ninguém põe um remendo de pano novo numa roupa velha; (...) Ninguém põe vinho novo em odres velhos; porque o vinho novo arrebenta os odres velhos e o vinho e os odres se perdem”. (Marcos 2,18-22).

Além disso, diferentemente dos judeus que subiam ao Templo para orar, Jesus se afastava dele e orava sozinho nos montes e em locais desertos como registra Marcos 1: 35 “Levantando-se de manhã muito cedo, ainda escuro, saiu, e foi para um lugar deserto, e ali orava”; além disso, ele orientou os discípulos a agir da mesma maneira: “tu quando orares, entra no teu quarto, e, fechando a tua porta ora a teu Pai que está em secreto” (Mat. 6: 6) Ao ser questionado sobre o local correto de adoração, se em Jerusalém ou em Gerizim, disse: “A hora vem em que nem neste monte nem em Jerusalém adorarão o Pai (...) Vem a hora e já chegou em que os verdadeiros adoradores adorarão o Pai em espírito e em verdade” (João 4: 21-23) Na casa de Zaqueu ao ser questionado pelos fariseus que o acusava de ter entrado para ser hóspede na casa de um pecador (Luc 19: 7) Ele quebrou a regra da linhagem genealogica e afirma: “também este é filho de Abraão” (Luc. 19: 9)

A religião faz distinção entre puros e impuros, santos e pecadores, filhos de Deus e criaturas de Deus, entre salvos e perdidos; entre lugares sagrados e lugares profanos. Na religião, as pessoas existem para servir às divindades e manter as instituições.

Uma espiritualidade madura como aquela demonstrada por Jesus, olha para as pessoas e as acolhe, não faz distinção entre as pessoas, de forma que todos são iguais perante o Pai. Jesus viveu intensamente sua espiritualidade, sem se tornar um religioso. Ninguém foi mais espiritual do que Jesus, porque ninguém foi mais humano do que Ele. A religiosidade nos embrutece, a espiritualidade nos humaniza, de forma que religiosidade e espiritualidade seguem caminhos opostos: quanto mais espiritual a pessoa é, menos religioso se torna; a recíproca também é verdadeira, quanto mais religioso menos espiritual.

Atualmente, as religiões servem em parte para controlar a conduta moral da sociedade, cumprindo seu papel de aparelho ideológico, muito embora a conduta moral, nada tenha a ver com as religiões; ela é produto da espiritualidade endógena; de forma que quanto mais espiritual, mais humana, afetiva e mais compreensiva a pessoa se torna; ao contrário, o aumento da religiosidade torna os homens mais arrogantes, intransigentes e intolerantes com as falhas dos outros; a religião dissemina ódio, preconceito e fanatismo; em outras palavras: quanto mais “santo”, mais ranzinza, mais rabugento, odioso e intransigente.

Segundo o sociólogo norte-americano Phil Zuckerman[2] os países menos religiosos do mundo são mais éticos, justos, possuem baixa taxa de criminalidade e altos índices de qualidade de vida e igualdade entre as pessoas. Ao contrário, os países mais religiosos apresentam altos índices de desigualdade, criminalidade, corrupção e injustiça social. Em um artigo intitulado “Deus Nos Livre de um Brasil Evangélico” [3] Ricardo Gondim lista uma série de razões pelas quais o Brasil seria pior do que é atualmente: seria um país com menos cultura e sem respeito às liberdades individuais; mais preconceituoso, fisiologista e intolerante.

Mas alguém perguntaria: se houvesse um mundo sem religiões, ele seria melhor? Não tenho certeza, mas imagino que um mundo sem religiões, sem ideologias religiosas, teria mais espiritualidade, as pessoas teriam tempo para cultivar valores espirituais; teria menos guerras, já que grande parte das guerras tem motivação religiosa. Imagino que um mundo sem religiões teria menos sofrimento. Muitas das desgraças da humanidade aconteceram em nome de Deus e de idéias religiosas. Imagino que ele será mais tolerante; religião é um meio de alienação das pessoas que, entorpecidas e movidas pelo zelo excessivo, promovem a dor e o sofrimento alheio. Um mundo assim, não seria perfeito, mas teria menos ódio, mágoas, e rancores, menos discriminação, menos preconceitos, arrogância, superstições, obscurantismo, guerras, perseguições e fanatismo e mais respeito pelas diferenças. Por tudo isso, apesar de não passar de uma miragem, eu ainda insisto em imaginar a possibilidade de ... UM MUNDO SEM RELIGIÕES.


[1] Uso aqui a palavra espiritual no sentido de cultivo dos valores do espírito, da psique da dimensão humana que não se volta para o transcendente, para o mundo da religião

[2]Phil Zuckerman. Society Without God – What the Least Religious Nations Can Tell Us About Contentment" Traduzido por: Sociedade sem Deus – O que as nações menos religiosas podem nos dizer a respeito da satisfação.

[3]Gondim, Ricardo. Deus Nos Livre de um Brasil Evangélico. Disponível em: http://www.ricardogondim.com.br/Artigos/artigos.info.asp?tp=65&sg=0&id=2400

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quinta-feira, junho 23, 2011

A ÚLTIMA UTOPIA BÍBLICA: PISTAS PARA UMA HERMENÊUTICA ESCATOLÓGICA

“É preciso sonhar sempre e recomeçar indefinidamente a mesma projeção para um futuro vislumbrado utopicamente” (José Comblin)

Talvez seja difícil de admitir, mas a Bíblia é essencialmente um livro de utopias. Sei muito bem os riscos que corro, pois o simples fato de dizer que alguma coisa na Bíblia é utopia soa como heresia, apostasia e desvio doutrinário. A dificuldade de admitir isso está no conceito que temos sobre o que seja utopia. Para os cristãos, utopia significa mentira, quimera, algo irrealizável, delírio, fantasia, lugar inexistente, portanto uma falsa promessa.

O Dicionário Houaiss define utopia como: “qualquer descrição imaginativa de uma sociedade ideal, fundamentada em leis justas e em instituições político-econômicas verdadeiramente comprometidas com o bem-estar da coletividade” Nesse sentido, pergunta-se: existe livro mais utópico que a Bíblia?

Em seu livro "A utopia" Thomas Morus cria um mundo simples e igualitário. Uma criação imaginária de um mundo ideal que descreve realidade não como ela é e sim como deveria ser.

Aprendemos desde cedo a ver a utopia como algo inatingível, distante e irrealizável, ilusão sonho irrealizável. Nada pode ser mais falso do que isso. Na lúcida opinião de Pedrinho Guareschi, a utopia deve ser vista como uma realidade ainda não conquistada, diz ele que é a “Esperança de que aquilo que não é, não existe agora, pode vir a ser, tornando realidade presente aquilo que precisa acontecer”[1]

Outro problema que limita o nosso horizonte hermenêutico é o fato de lermos a literatura bíblica sem considerar o gênero. Dessa forma lemos literatura apocalíptica como se fosse profecia; esperança escatológica como promessa e teologia como se fosse história. Assim, temos dificuldades em entender determinados textos. Embora não seja possível discutir as diferenças existentes, fica evidente que são gêneros distintos.

Que lugar deve ocupar a utopia na pregação da Igreja? Seria ela realmente “um não lugar” ou um “lugar ainda não?” A utopia é a “imaginação criadora”, que visualiza no presente um futuro ainda invisível, porém real, que enxerga a partir do presente, uma realidade possível de ser transformada ou pelo menos melhorada. Nesse sentido, é necessário reacender a imaginação utópica como um meio de transcender às limitações impostas pela dureza do tempo presente, crendo que o utopista é mais que um sonhador, é um visionário e que a utopia é mais que um sonho, é um ideal. Para Pedrinho Guareschi: “A utopia luta pela materialização de um desejo presente. Ela ‘projeta’, isto é, ‘lança adiante de si, as coisas que devem acontecer e poderão acontecer se o homem quiser. A imaginação utópica dá a luz o que já está presente no seio das coisas”[2]

Além disso, a utopia deve ser vista pela sua utilidade. Para que serve uma utopia? Devemos lembrar que o escatologista é antes e acima de tudo um utopista. A mensagem escatológica é eminentemente parenética, se volta para o encorajamento e para o consolo, de forma que o seu elemento basilar não é a certeza de que as coisas serão assim, mas a esperança de uma vitória final. Precisamos olhar para a pregação de Isaias se quisermos entender o sentido e a função da mensagem profética: “Consolai, consolai o meu povo, diz o vosso Deus” (Isaias 40: 1) Pedro César Kemp Gonçalves assinala que: “A utopia se apresenta como aquilo que nos situa no inexistente, transcendendo ao dado concreto. Ela aplica–se à ausência de alguma coisa. Aparece quando há rejeição da realidade determinista, criando um projeto futuro onde se realizem os seus desejos e aspirações: um futuro que lhe sorria”.[3] O grande problema da pregação cristã é que ela pretende se apoiar na certeza, no absoluto e muitas vezes se torna um canal de frustrações e desesperanças.

Uma olhada ainda que superficial no texto bíblico revela que a utopia ocupa um lugar importante na caminhada de fé, afinal, a fé é possivelmente a maior das utopias que se pode alimentar na experiência cristã. A fé não se caracteriza por ser um lugar aonde se chega e sim por ser um jeito de continuar indo. Como diz Ed René Kivitz: “a fé é aquilo em nós que nos coloca em movimento[4]; em outras palavras: a fé é a única forma de se continuar andando quando o caminho acaba. Nesse sentido, a fé é a mais significativa das utopias, uma vez que só por ela é possível continuar andando em meio ás crises e desesperanças da vida. Segundo Eduardo Galeano, a utopia é isso, serve para eu não deixe de caminhar.

Dessa forma mesmo sem ter a pretensão se ser exaustivo, proponho olharmos para algumas utopias que emergem do texto bíblico. Dentre estas podemos citar:

A UTOPIA DA ETERNA MONARQUIA DAVÍDICA.

Uma das promessas mais contundentes da Bíblia afirma que não faltaria rei sobre o trono de Davi. “Tua casa e teu reino serão firmados para sempre diante de mim” (2 Samuel 7:16) Essa utopia foi confirmada pelo profeta Jeremias; a continuidade da monarquia davídica era uma garantia dada pelo próprio Deus, conforme a expressa a palavra profética: “Pois assim diz o Senhor: Nunca faltará a Davi homem que se assente sobre o trono da casa de Israel” (Jer. 33:17) Essa promessa alimentou os sonhos monárquicos do povo de Israel que vivia a segurança de sempre ter um rei no trono de Davi. O fim da realeza e ainda do povo para o exílio babilônico revelou que tudo aquilo não passava de uma grande utopia, serviu para andar, mas não teve cumprimento. Espiritualizar a mensagem atribuindo a Jesus o cumprimento dessa promessa não atende aos anseios do povo Judeu, que sonhava com uma volta aos tempos áureos de Davi e Salomão.

A UTOPIA DA REUNIFICAÇÃO DO REINO DE ISRAEL

A promessa de que Israel seria reunificado outra vez foi feita pelo profeta Ezequiel. “Farei deles um só povo na terra e será um só rei que os comande a todos. E nunca mais formarão duas nações, nem se dividirão para o futuro em dois reinos” (Ez. 37: 22). Não precisamos fazer muito esforço para saber que essa utopia, apesar de ter consolado e sustentado o povo no exílio, também não se tornou uma realidade, mas serviu para caminhar em meio à crise de desesperança que ameaçava o povo no exílio.

A UTOPIA DO MESSIAS RESTAURADOR.

Em meio à crise que se abate sobre o povo de Israel, com a perda da terra, a destruição do templo, o esfacelamento da realeza, é proclamada a vinda de um descendente de Davi para restaurar o reino a Israel. A escatologia pós exílica preconizava que “o Dia de Iahweh” haveria de vir, e que o reino davídico iria ser de novo restabelecido” [5] Toda a caminhada do povo de Israel foi pautada na certeza de que quando o Messias chegasse, ele “restauraria todas as coisas” Nas palavras dos apóstolos no caminho de Emaús: “nós esperávamos que fosse ele quem havia de remir Israel” (Luc: 24:21) Atos 1.6 registra a pergunta ainda sem resposta: “Senhor, restaurarás tu neste tempo o reino a Israel?”Muito bem, ainda que sejam possíveis reinterpretações capazes de fornecer novos sentidos para as expectativas frustradas, a idéia de um messias restaurador da monarquia em Israel permanece como uma utopia que permeia o imaginário do povo Judeu de forma inconclusa.

A UTOPIA DO NOVO ÊXODO.

A mensagem que emana dos profetas exílicos dá conta de que no retorno para a palestina, Deus faria um novo Êxodo, seria uma volta triunfante; rios brotariam no deserto e jardins no ermo. Tal promessa não se realizou; a volta para a terra foi marcada por crises, conflitos internos e trabalho duro para restaurar os muros e as portas da cidade. Como salienta Alfred Lapple: “Outrora, a travessia das tribos israelitas pelo deserto estivera aureolada de maravilhas. E o caminho de retorno do exílio foi vazio de prodígios. Não houve o triunfo sonhado nem a recepção festiva na pátria, como se esperava. A terra estava devastada, as cidades destruídas” [6] E mais ainda, que “O sonho de um novo reino davídico constituía uma utopia, que politicamente não era mais realizável”.[7] Louis Monloubou assinala que “Ezequiel, e, mais tarde, o Segundo Isaias (...) proclamaram oráculos que davam a esperança de uma restauração maravilhosa. Ora, a realidade do retorno foi muito inferior às predições. Não teria sido esta utopia não realizada do profetismo do fim do exílio um novo motivo de desencanto?”[8] Basta olhar os relatos dos que voltaram do exílio para ver que o novo êxodo foi uma utopia.

A UTOPIA DO PARAISO TERRESTRE.

O profeta Isaias no capitulo 65 afirma que Deus faria um paraíso na terra, no qual as pessoas não experimentariam o sofrimento “nunca mais se ouvirá nela choro nem voz de clamor” (v.19). Nela não há mortalidade infantil, já que “Não haverá nela criança que viva poucos dias” (v.20). Nele as pessoas morrem, mas gozam da longevidade; “aquele que morrer com cem anos será tido por jovem” (v.2). Lá haveria pecado, pois “o pecador que não conseguir alcançar cem anos será considerado amaldiçoado” (v.20). Nesse lugar o lobo e o cordeiro vivem em paz: “O lobo e o cordeiro se apascentarão juntos, e o leão comerá palha como o boi” (v. 25) e a serpente agora se alimenta de pó. E não adianta dizer que esse texto tem a ver com a Nova Jerusalém descrita em apocalipse 21, pois naquela, segundo a narrativa do apocalipticista: “não haverá mais morte, nem pranto, nem clamor, nem dor” (v.4) e nela não entrará pecadores. Para Jacir de Freitas Faria “o livro do Apocalipse faz uma grande inclusão, isto é, repete as páginas iniciais da Bíblia sobre o Paraíso Terrestre ao apresentar a utopia da Jerusalém Celeste”[9]. A esperança de um paraíso na terra sem as contradições descritas em Isaias está presente de forma indelével no inconsciente coletivo da raça humana, mas sejamos realistas: é uma lida e admirável utopia.

A UTOPIA DA PARUSIA IMINENTE.

“Pois o filho do homem virá na glória de seu Pai, com os anjos, e então recompensará a cada um segundo suas obras. Em verdade vos digo, alguns dos que aqui estão não provarão a morte até que vejam vir o Filho do homem no seu reino” (Mateus 16:27-28). Mateus 24 fala dos sinais da volta de Jesus; o versículo 30 é enfático: “Então aparecerá no céu o sinal do filho do homem, e todos os povos da terra se lamentarão e verão o filho do homem, vindo nas nuvens do céu, com poder e grande glória”, e depois reforçando o que fora dita em Mateus 16: 28, conclui: “Em verdade vos digo que não passará esta geração sem que todas estas coisas aconteçam” (Mat. 24:34) A Igreja primitiva viveu a certeza de uma volta imediata de Jesus, e não se pode negar que havia base para tal espera. A volta não se deu no tempo esperado, as profecias foram revistas, mas a Igreja não deixou de caminhar.

A UTOPIA DO RETORNO INCERTO:

Depois da expectativa frustrada do retorno iminente de Cristo, a esperança foi revista e para um retorno num tempo incerto; sabe-se que Ele virá, mas não se sabe quando. O próprio texto bíblico fornece pistas conflitantes acerca do assunto. Depois de descrever os eventos que antecedem à volta de Jesus, afirma que apenas o Pai sabe o dia e a hora. Dessa forma, todas as gerações, desde o primeiro século até a presente data, viveram e morreram na certeza de que Cristo voltaria em seu tempo. Os sinais da volta de Cristo se repetem e se renovam em cada geração. Como não vivemos a geração anterior, acreditamos que tudo é inusitado e revelador. Nesse sentido, a volta corpórea de Jesus pode ser considerada como a última utopia bíblica, pois aponta para um “não lugar” para o qual se caminha. Não podemos afirmar que Jesus não virá; isso seria transformar a utopia em distopia.[10] Mas uma coisa é certa: a esperança da volta de Jesus é a mais bela e significativa de todas as utopias, e por ela vamos continuar a caminhada.

FONTES:

Läpple, Alfred. Bíblia Interpretação Atualizada e Catequese, Vol. 2. O Antigo testamento, São Paulo, Paulinas, 1978.

Monloubou, Louis. Os profetas do Antigo Testamento. Cadernos Bíblicos. São Paulo, Paulinas, 1986.

Faria, Jacir de Freitas. Juízes: utopia ou invenção de uma sociedade igualitária?

Guareschi, Pedrinho. Sociologia Crítica: Alternativas de Mudança. 20ª Ed. Porto Alegre, Mundo Jovem, 1989.

Gonçalves, Pedro César Kemp . Reflexões sobre a religião como utopia e esperança. São Paulo, Paulinas, 1985

Kivitz, Ed René. Outra Espiritualidade, São Paulo, Mundo Cristão, 2006

[1] Guareschi, Pedrinho. Sociologia Crítica: Alternativas de Mudança. Mundo Jovem, 1989, p. 121

[2] Ídem, p. 121

[3] Pedro César Kemp Gonçalves. Reflexões sobre a religião como utopia e esperança. p. 39

[4] Kivitz, Ed René. Outra Espiritualidade, São Paulo, Mundo Cristão, p. 186

[5] Lapple, Alfred, Bíblia Interpretação Atualizada e Catequese, Vol. 2. O Antigo testamento. São Paulo, Paulinas 1979, p. 161

[6] Lapple, Alfred. Op. Cit. p. 162

[7] Idem, p. 163

[8] Monloubou, Louis. Os Profetas do Antigo Testamento. Paulinas, 1986, p. 72

[9] Jacir de Freitas Faria. Juízes: utopia ou invenção de uma sociedade igualitária? Disponível em :http://www.bibliaeapocrifos.com.br/conteudo.asp?p=p000140

[10] Usada inicialmente por John Stuart Mill, a palavra “Distopia” é formada do prefixo grego (δυσ) "dis" traduzida por "estranho", "anormal", ou "mau" e (τόπος) "topos" lugar. Distopia, portanto, seria um "lugar mau" ou um “mau lugar”

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sábado, junho 18, 2011

NEOFARISAÍSMO EVANGÉLICO: A FACE OCULTA DO CRISTIANISMO FUNDAMENTALISTA

“Aquele que estiver sem pecado seja o primeiro a atirar a pedra” (Jesus)

Dois episódios recentes um envolvendo o pastor Ricardo Gondim e outro, a Pastora Odja Barros[1], revelaram as entranhas de um verdadeiro cristianismo farisaico e serviu para mostrar toda a hipocrisia e a maldade que permeia o coração de muitos cristãos que se escondem por trás de máscaras de santidade, de ortodoxia, de defesa da fé; que agem de forma impiedosa e cruel, que não se importam em agredir e macular a imagem de pessoas que deveriam proteger, pelo simples fato de serem parte da família. Segundo Jesus, a identidade do cristão deveria ser o amor, no entanto, a intolerância religiosa tem sido a marca do cristianismo moderno, calcado na fé, porém destituído de amor; que prega a paz, mas se alegra em perseguir, ferir, machucar, julgar e sentenciar aqueles que pensam de forma diferente; que permanece insensível à dor e ao sofrimento alheio.

Em um texto publicado recentemente, Frei Beto pronunciou uma palavra que considero emblemática: “Prefiro um ateu que ama o próximo a um devoto que o oprime” Sinceramente acho preferível um ateu, agnóstico ou mesmo um sem religião que seja compassivo, a um cristão intolerante, raivoso e soberbo, como muitos que temos visto nos últimos dias. Tenho dúvidas que se possa considerar como cristãos, pessoas cujas palavras são sempre ásperas, duras, maldosas cheias de julgamento e impiedade. Embora estejamos separados por dois mil anos, há que se perguntar: em que o fundamentalismo religioso atual difere do farisaísmo antigo?

Os fundamentalistas criticam os fariseus por suas condutas em relação a Jesus, taxando-os de radicais, de viver uma religiosidade aparente, mas na prática se comportam do mesmo jeito. Basta olharmos para a Bíblia que muitos acreditam defender, para ver que ela na verdade denuncia o quão distante tais atitudes se encontram do espírito do evangelho. Agimos hoje muito mais próximos do espírito fanático do farisaísmo que das orientações do evangelho; mais próximos da agressividade dos apóstolos, que munidos da fé indagaram: Senhor, queres que digamos que desça fogo do céu e os consuma, como Elias também fez?, que da atitude compassiva do mestre que os repreendeu dizendo “Vós não sabeis de que espírito sois” (Lucas 9:51-56). Para os apóstolos, a recusa dos samaritanos de receber a Jesus justificava a morte deles, afinal eram pecadores, incrédulos e impuros. A religiosidade farisaica ama a doutrina, o grupo e as convicções religiosas mais do que as pessoas, de forma que para defender a fé, e os postulados da sua doutrina, não se importa em matar e em destruir em nome de Deus.

Tais atitudes revelam a enfermidade que se instalou no meio do “corpo de Cristo” em sua caminhada. Jesus teve a sua autoridade questionada pelos fariseus “Se esse homem fosse profeta saberia quem é essa mulher”. Luc 7: 39; as Cruzadas foram realizadas em nome da fé, para matar os infiéis e libertar o túmulo de Cristo; a Inquisição foi criada para combater as heresias, purificando a igreja dos hereges que ousavam pensar diferente; As bruxas foram queimadas para evitar que atraíssem o castigo de Deus sobre os fiéis, bons, puros e imaculados; em Genebra os incrédulos e hereges eram queimados na fogueira para defender a fé. O festejado Lutero só escapou da fogueira acusado de heresia, por ter recebido a proteção dos príncipes.

Algumas características do farisaísmo antigo são ainda bastante atuais em nossos dias, dentre estas: DISPOSIÇÃO PARA JULGAR E CONDENAR: os fariseus adoravam apanhar as pessoas e levarem-nas a julgamento para condená-las e apedrejá-las; foi assim com a mulher adúltera. Outra marca dos fariseus era a capacidade de se escandalizarem: em diversos momentos as palavras de Jesus soaram nos ouvidos dos fariseus com heresia e ofensa às leis de Deus, como registra Mateus 15:1-12Por que transgridem os teus discípulos a tradição dos anciãos? pois não lavam as mãos, quando comem” (v. 2) Para Jesus: “Não é o que entra pela boca que contamina o homem; mas o que sai da boca, isso é o que o contamina” (v. 11) “Então os discípulos, aproximando-se dele, perguntaram-lhe: Sabes que os [fariseus], ouvindo essas palavras, se escandalizaram?”; (v.12). Jesus foi chamado de blasfemo, impostor, comilão, beberrão, mentiroso, transgressor da lei; endemoniado, de não cumprir a tradição, amigo de pecadores, em outras palavras um falso profeta.

ATITUDE DE SANTIDADE E ESPIRITUALIDADE SUPERIOR: Os fariseus eram os mais puros, mais espirituais, dizimistas fiéis, faziam jejum, davam esmolas, oravam em público para que todos soubessem que eram piedosos. Julgavam-se melhores que os outros. mais fiéis, cumpridores da Lei e não admitiam outra forma de viver a religião. Eram radicais em cobrar perfeição dos outros, no entanto, aquela santidade aparente não impediu que Jesus visse aí sinais de hipocrisia e os identificasse como “sepulcros caiados”. Esse tipo de espiritualidade não passa de aparência, de casca, em outras palavras, mera religiosidade estéril.

CRENÇAS CORRETAS E VERDADES ABSOLUTAS: Como no passado, os fariseus de hoje também são cumpridores rigorosos de seus deveres religiosos, das doutrinas, mas cultivam orgulho, inveja e permitem que o ódio floresça em seus corações. As verdades defendidas são absolutas, se consideram os únicos autorizados a falar em nome de Deus, são fanáticos e alimentam disposições para linchamento dos inimigos da fé. Defendem a fé sem amor nem atitude compassiva e sem misericórdia. Paulo nos ensina que fé sem amor é apenas barulho. Uma fé cega apenas alimenta ódio entre as pessoas. Como adverte Caio Fábio: “quando a missão passa a ser um fim em si mesma, surge sempre o espírito da dominação. Nesse caso, tudo aquilo que aparentemente contrarie o projeto religioso é interpretado como uma declaração de guerra, aí as armas são sacadas e é hora de fazer "fogo cair do céu".[2]

Fico impressionado com o cristianismo praticado por muitos defensores da fé. Basta ver os termos utilizados por pessoas que se dizem cristãs para se referir a pessoas que deveriam pelo menos merecer respeito. São palavras cheias de ódio acusações e condenações, que em nada lembram pessoas que se preparam para serem “arrebatadas”, que estão apenas esperando a volta de Cristo para serem “levadas para o céu”. Termos como safado, babaca, otário, filho de uma égua, imbecil, velho maluco, excremento, louco varrido, prostituta, lésbica e outros tantos. Talvez seja útil lembrar o conselho de Paulo: Não saia da vossa boca nenhuma palavra torpe, mas só a que for boa para promover a edificação, para que dê graça aos que a ouvem” (Efésios 4:29). Pessoas são taxadas e rotuladas como falsos profetas, enganadores, são acusadas de não serem convertidas condenadas antecipadamente ao fogo do inferno.

Ainda que todos tenham o direito de concordar ou discordar de toda e qualquer posição teológica adotada, não acho que tenhamos direito de condenar ninguém. A Bíblia, que tanto se tenta defender, diz “Não julgueis”, não retribuam mal com mal. Tiago recomenda cuidado com a língua. Pelo que vejo o Pastor Ricardo e a Pastora Odja Barros não estão obrigando ninguém a crer como eles, não estão criando uma regra para todos; eles pensam de forma diferente e precisamos ter maturidade para discordar das idéias sem atacar as pessoas.

Cremos em muitas coisas de forma diferente, basta olhar as muitas denominações existentes. Fico impressionado como se côa mosquitos e se engole camelos. Pessoas que vivem de enganar e mentir para ganhar dinheiro são reconhecidos como homens de Deus, premiados com ofertas, aviões, canais de TV e outras coisas mais. Defendo o direito de todos que discordam do pastor Ricardo, e do posicionamento da Pastora Odja Barros, mas é preciso separar as pessoas das idéias, defender aquilo que se crer, sem ofender; afinal a ninguém é dado o direito de agir como juiz com autoridade para julgar e condenar, maculando a integridade das pessoas. Diz a Bíblia: “Não julgueis e não sereis julgados; não condeneis e não sereis condenados (...) porque com a mesma medida com que medirdes os outros, vós também sereis medidos” Luc. 6:37-38; “Quem és tu, para julgar o teu próximo? (Tiago 4,12). “Quem és tu para julgar o criado de outro?”(Rom.14,4)

Tenho observado que toda vez que alguém apresenta uma visão que discorda da opinião dominante, é logo taxado de herege, rotulado de sem fé, desviado do evangelho e é impiedosamente sentenciado. Como diz caio Fábio: “às vezes, sem pressentir, a gente vai se distanciando completamente do espírito amoroso, misericordioso, solidário e inclusivo de Jesus, e caímos na religião da exclusão, da vingança, do julgamento e da guerra” [3].

Acreditar de forma diferente é um direito que todos possuem. Estabelecer uma ditadura teológica de forma a obrigar todos a crerem nas mesmas coisas e da mesma forma, sob pena de ser julgado e condenado, revela um comportamento mais próximo do extremismo talibã do que do pacifismo do evangelho. Por pensar e ensinar diferente da teologia oficial foi que Jesus foi crucificado, e vejo que os crucificadores ainda continuam agindo. Pensar diferente, crer de forma diferente é um direito sagrado, concedido por Deus e ser impedido de pensar é uma violência digna dos tempos mais obscuros da história. O princípio batista da liberdade do indivíduo de crer conforme a sua consciência, tem sido vilipendiado por pessoas que acreditam ter o monopólio da interpretação bíblica de forma que suas conclusões são canônicas, dogmáticas e não admitem opinião contrária. Estou convencido de que se quisermos viver como cristãos, a primeira coisa que precisamos aprender é a respeitar as pessoas em sua liberdade, afinal, quem de nós foi nomeado por Deus como juiz? Quem quiser que se habilite. Como disse um condenado do passado: boa medida, recalcada, sacudida, transbordante, generosamente vos darão; porque com a medida com que tiverdes medido vos medirão também”. Lucas 6:38


[1] O primeiro documento foi um vídeo de uma palestra do Pastor Ricardo Gondim que fala da volta de Jesus como Utopia, divulgado na Internet; o segundo foi um documento publicado pela Aliança de Batistas do Brasil e assinado pela sua presidente Pastora Odja Barros.

[2] D’Araújo Filho, Caio Fábio. Ame a Deus de Todo Coração. A Religião Não! http://fabiomenen.blogspot.com/2011/05/caio-fabio-ame-deus-de-todo-coracao.html

[3] Idem

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quinta-feira, junho 16, 2011

THEOSIS: A DEIFICAÇÃO DA HUMANIDADE (PARTE 7)

Chegamos à ultima publicação sobre o tema da Theosis

UMA FUNDAMENTAÇÃO GNÓSTICO-FILOSÓFICA PARA A DOUTRINA DA DIVINIZAÇÃO DO HOMEM

As raízes da doutrina da Divinização humana podem ser encontradas nos postulados do Gnosticismo, se aceitarmos que o autor de II Pedro estava se posicionando contrariamente as doutrinas Gnósticas emergentes no seu tempo, será difícil entender as razoes pelas quais, temas teológicos como este, seja abordado aqui pelo autor, é provável que o objetivo seja não simplesmente contestar ou negar o seu valor, e sim, fornecer o verdadeiro sentido para verdades, tão profundas e sutis dos propósitos da salvação Em oposição aos postulados teológicos do Gnosticismo.o Apóstolo apresenta seu ponto de vista

Os fundamentos da doutrina gnóstica se encontram no próprio texto sagrado conforme lemos:

“E disse Deus: Façamos o Homem à nossa imagem conforme a nossa semelhança (Gênesis, 1: 26)

Seguindo esta passagem bíblica fundamental – e atendendo à Queda do Homem na matéria -, os gnósticos cristãos tiraram daí todas as conseqüências, pois, com a Queda (que obscurece a sua dignidade espiritual, o Homem, embora mantendo inteira e imanente a imagem divina, perdeu, entretanto a semelhança divina que tinha no Jardim do Éden, mantendo-se esta apenas potencial ou virtual. Essa “semelhança divina”, deverá ser reencontrada e readquirida.

Para os Gnósticos, o alvo da redenção era a participação do homem na natureza Divina, ou seja: a participação do remido no Aeon, emanações angélicas de Deus, tornando-se uma partícula da natureza Divina. Trazendo em si alguns aspectos dos Atributos Divinos, assim a participação do homem na Divindade, consistia na transformação do homem em um Aeon. Materializado em partículas individuais do ser Divino, e ainda de acordo com a Teologia Gnóstica esse novo Aeon era absorvido pela Divindade perdendo sua individualidade e sua identidade. Segundo o comentarista Champlin, a Teologia do autor da Carta de II Pedro vai muito além do pensamento Gnóstico, que aceitava uma participação secundária do homem na Divindade apenas como “AEONS” ou emanações. Para os defensores da Divinização da humanidade, a nossa participação vai muito além e é muito mais real, assim afirma: Haveremos de ser cheios de toda plenitude de Deus (...) chegando a manifestar todas as suas perfeições, todos os seus atributos”. (CHAMPLIN P. 180) A Teologia da Divinização do homem portanto, expressa em termos reais apresenta alguns exageros, que devem ser considerados por exemplo: Ao afirmar a participação na divindade a ponto de manifestar “todas as suas perfeições” e todos os seus “atributos”, podemos afirmar que a doutrina atinge o seu ápice com uma “deificação real” do homem tornando-se por assim dizer “deuses”, seres onipotentes capazes de realizar qualquer coisa, este é o ponto em que procura evitar a maior parte dos defensores da doutrina da “Divinização do homem”, no entanto rejeitando, portanto, a sua “deificação”

Ao analisar a possível absorção do homem em Deus. A teologia Gnóstica é ampliada pelos defensores desse postulado, dando a ela uma aplicação mais pessoal, em função dos seus pressupostos teológicos. “Mais a verdade é que os remidos participarão da Divindade, sem perderem sua identidade pessoal, tal como o filho é dis­tinto do seu pai, embora ambos tenham a mesma natureza”. (CHAMPLIN P. 180)

Seguindo esta perspectiva, é responsabilidade do Homem readquirir essa dignidade espiritual, que ele possuía in principio e que perdeu com a Queda, passar enfim da potencialidade à realidade divina. Para tal são precisas duas coisas: a existência da potencialidade (uma graça divina) e a realização dessa virtualidade (pelo esforço pessoal e pela graça), isto é a divinização, os que são, na realidade, dois momentos indissociáveis do percurso do cristão. Recorde-se que para a Gnose, apesar da Queda, “existe no Homem uma parcela divina ou espiritual que provém do mundo superior e que aspira a ser purificada da ganga que a aprisiona, a fim de retornar à sua pátria celeste” (J.M. Ansembourg, La gnose et les gnoses, in “L’Esprit des cchoses”, vol. III, nº. 8-9, CIREM, Guérigny);

Segundo a crença gnóstica, “um ou vários mediadores descem através dos Éons (ou Aions) para trazer aos Eleitos a Gnose que lhes dará aqui em baixo a purificação e a via de repatriamento, isto é, a regeneração (para os gnósticos cristãos). O último e o único Mediador é o Cristo (que transmitiu secretamente a Gnose aos seus discípulos” (J.M. Ansembourg, La gnose et les gnoses, in “L’Esprit des cchoses”, vol. III, nº. 8-9, CIREM, Guérigny.)

Para a Gnose, apesar da Queda, “existe no Homem uma parcela divina ou espiritual que provém do mundo superior e que aspira a ser purificada da carne que a aprisiona, a fim de retornar à sua pátria celeste”; além disso, “um ou vários mediadores descem através dos Éons (ou Aions) para trazer aos Eleitos a Gnose que lhes dará aqui em baixo a purificação e a via de repatriamento, isto é, a regeneração. Para os gnósticos cristãos. O último e o único Mediador é o Cristo que transmitiu secretamente a Gnose aos seus discípulos.

A palavra gnose aparece já no Novo Testamento 29 vezes – por exemplo, a riqueza, a sabedoria e a gnose de Deus (Rom., 11, 33), o perfume da gnose (II Cor. 2, 14), a chave da gnose (Luc., 11, 52) e Crescei na graça e na gnose de Nosso Senhor e Salvador Jesus Cristo (II Pedro, 3, 18) -, com o sentido de ciência secreta, reservada a uma elite (outra “antipatia” a que os gnósticos já nos habituaram…), a qual é transmitida por uma Unção que engendra o Corpo de Glória, fim do processo de divinização, pois ele consiste em tornar o homem inteiro perfeito (“teleios”) em Cristo (I Col., 1: 26-28).

UMA PROPOSTA PANTEÍSTA:

O ESTOlClSMO

Para os filósofos estóicos “A Natureza Divina”, ou Seja, a “THElA PRUSlS”, era uma realidade global, podendo assim ser compreen­dida como urna proposta panteísta para a Doutrina da divinização da humanidade, urna vez que natureza envolve os fenômenos físicos, para ele Deus, homem, natureza física, formavam o “Panta” ou seja a “Theia Phusis”, quanto a proposta do estoicismo, argumenta-se que o sitz ln Leben deste texto aponta para urna compreensão de aceitação de que o salvo participava direta e ativamente da natureza Divina, não como urna atividade globalizante e sim corno transformação da natureza huma­na em uma outra natureza, marcada pela atuação Divina na formação do novo ser .Champlin não tem dúvida quanto a esta verdade sustenta este que: “Os remidos na qualidade de filho chegarão a participar de fato do “tipo” de vida de Deus. Essa é a única maneira em que esse termo poderia ter sido entendido nos dias, em que esta epistola foi composta”. (CHAMOLIN p. 180)

A TEOSOFIA:

A nova era tem como um dos seus objetivos a divinização do homem, por isso ele é parte central da sua doutrina. Acreditando que tudo que exista é Deus, no homem Deus se encontra na sua expressão máxima. Dentro do conceito da nova era o homem não é outra coisa senão Deus. Uma das maiores pensadoras da teosofia assim se expressa::
Vocês acreditam que o homem é um deus Por favor, diga Deus e não um deus. Ao nosso ver, o homem é o único Deus que podemos conhecer. E como poderia ser de outra forma? Nosso postulado aceita como verdadeiro que Deus é um principio universalmente difuso, infinito e, sendo assim, como poderia o homem sozinho escapar de ser embebido por essa deidade? Chamamos "Pai do céu" a essa essência deifica que reconhecemos dentro de nós em nosso coração e em nossa consciência espiritual (Helena P. Blavatsky).
Como deus a nova era diz que o homem é causa de tudo que existe na humanidade, ou seja, o bem e o mal, pois tudo reside dentro dele. Nesse conceito dizem também que o homem vem passando por um estado progressivo de consciência em que ele vai chegar a sua divinização, e que cristo não é uma qualidade exclusiva de Jesus, mas que o homem também pode chegar através de sucessivas reencarnações, ainda sobre esse assunto o diabo segundo eles não existe como um ser pessoal.

UMA LEITURA ANTROPOTEOLÓGICA: A DEIFICAÇÃO DO HOMEM

Entende-se por antropoteologia a corrente mais radical que fundamentada na doutrina da Theosis, afirma uma deificação expressa do ser humano. Esta proposta encontra eco também na teologia dos mórmons, na nova era e entre os defensores da confissão positiva.

Um dos maiores expoentes dessa teologia é Kenneth Hagin, afirma ele: “Você é tanto uma encarnação de Deus quanto Jesus Cristo o foi. Cada homem que nasceu de Deus é uma encarnação e o cristianismo é um milagre. O crente é uma encarnação tanto quanto foi Jesus de Nazaré”. (HAGIN, Word Of Faith, pg.14)

Ao afirmar o homem como encarnação da Divindade, Hagin parece acreditar em uma origem Divina do homem tal qual Jesus, Equiparando o homem ao próprio Cristo em todos sentidos.

Copeland vai além ao afirmar explicitamente a Divindade, ou a deidade do salvo. “Você não tem um deus dentro de você, você é um Deus”. (Kenneth COPELAND, Fita Cassete The Force Of Love BBC 56 Citado por Paulo Romeiro em Supercrentes, pg.50)

No pensamento de Copeland, a identificação do homem com Cristo, não o torna apenas Co-Participantes da “Natureza Divina”, torna o salvo o próprio Deus, com todas as implicações teológicas que isso possa trazer. Por exemplo, o politeísmo resultante.da proliferação de novos deuses

Para os protagonistas da doutrina da Theosis: “Até que compreendamos que somos pequenos deuses e comecemos a agir como pequenos deuses, não poderemos manifestar o Reino de Deus”. (Earl PAULK, Satan Un Masked, p. 97 apud Romeiro, p. 50)

REFERENCIAS

1 -GREEN, Michael. II Pedro e Judas, Introdução e Comentário série, Cultura Bíblica, 1ª Edição Co-Edição Vida Nova, São Paulo: Mundo Cristão, 1983.

2 -COTHENET, Edouard. As Epístolas de Pedro, Cadernos Bíblicos, São Paulo: Ed. paulinas, 1986.

3 - HAGGLUND, Bengt. História da Teologia, Tradução Mário L. REHFELDT,, Porto Alegre: Ed. Concórdia, 3ª Edição, 1986.

4 -CHAMPLIN, Russell Norman. O Novo Testamento Interpretado Versículo por versículo, Vol. VI , Guaratinguetá/SP: Ed. A Voz Bíblica Brasileira.

5 -MARTIN, Ralf P. Colossenses e Filemon, Introdução e Comentário, Série Cultura Bíblica, 2ª Edição, São Paulo: Co-Edição Vida Nova, Mundo Cristão, 1987.

6 -RIENECKER, Fritz; ROGERS C. Leon, Chave Lingüística do Novo Testamen­to Grego, Tradução Gordon Chow e Julio Paulo Zabatiero, São Paulo: Edições vida Nova, 2ª Edição, 1988.

7 – BÍBLIA DE JERUSALÉM. Nova Edição Revista, 3ª Impressão, 1987, São Paulo/SP. Edições paulinas.

8 – BÍBLIA VIDA NOVA, Edições Vida Nova.

9 - BRUCE, F.F. João, Introdução e Comentário, Série Cultura Bíblica, 1ª Edição, São Paulo: Co-Edição Vida Nova/Mundo Cristão, 1987

10 - ROMEIRO, Paulo. Supercrentes, o Evangelho Segundo Kennet Hagin, Valnice Milhomens e os Profetas da Prosperidade, São Paulo SP: Ed. Mundo Cristão, 1993.

11-REINOLDS, Noel B, MILLET, Robert L.Cristianismo Nos Últimos Dias Dez Questões Básicas (M&R-98) Provo, Utah: FARMS, . P. N/A

12 - ANES, Jose Manoel, A Theosis. Criação do Homem Divino, Instituto São Thomas de Aquino, 2005

13. MACGRATH, Alister E. Teologia – Sistemática, Histórica e Filosófica, Uma Introdução à Teologia Cristã, São Paulo Shedd, , 2005

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sexta-feira, junho 10, 2011

UMA SOCIEDADE PARA TODOS: UM PAÍS DE HOMOS E DE HÉTEROS

Esse texto é fruto de uma conversa informal, travada com um velho amigo acerca da querela envolvendo os homossexuais, PL 122, e decisão do STF. Diante de algumas ponderações feitas pelo meu articulista acerca dos direitos pleiteados pelos homossexuais (que deixo de transcrever aqui por respeito) resolvi escrever e refletir sobre o assunto.

Devo dizer inicialmente que tal ponto de vista não manifesta a opinião de qualquer instituição ou grupo organizado, é uma opinião pessoal. Segundo que não estou emitindo parecer sobre a homossexualidade, como certa ou errada do ponto de vista religioso, bíblico, teológico, filosófico ou moral (isso já seria outro debate) Mas como tenho recebido inúmeros manifestos assinados, a exemplo do “Manifesto da Convenção Batista Brasileira” e do “manifesto de Afirmação da Heterossexualidade” defendendo o “sagrado direito de condenar”, textos a meu ver carregados de moralismos e por que não dizer de hipocrisia, resolvi também me posicionar.

Existe uma máxima que ensina que se quisermos que um movimento se fortaleça basta começar a combater. Aconteceu com o cristianismo lembra? Cresceu motivado pela perseguição romana. Também com a igreja Universal do Reino de Deus, que de um negócio desconhecido, numa funerária do rio de Janeiro se tornou uma potencia mundial incentivada pela perseguição empreendida pela Rede Globo que deu visibilidade ao movimento e alavancou seu crescimento.

Creio que esse movimento não nos ameaça, se soubermos lidar com ele de forma madura e inteligente. Como disse Jesus aos apóstolos que queriam proibir o homem expulsava demônios em nome de Jesus: “Não proibais (...) quem não é contra nós é por nós” Marcos 9: 39 -40. A guerra religiosa não impediu que leis fossem aprovadas em diversos países (inclusive a Argentina) e nenhum país no qual o casamento homossexual foi aprovado mergulhou no caos como se pretende afirmar que acontecerá com o Brasil.

Quanto a direitos, o Brasil está repleto de leis que protegem determinados grupos e lhes conferem direitos especiais. Lei Maria da Penha (Mulheres) Se o homem bater na mulher vai preso mas se a mulher bater no homem não tem lei específica, apenas em caso de lesão, se aplica o Código Penal. Idosos (Estatuto do Idoso) Por ser idoso muita gente goza de direitos que a maioria não possui, viajar de graça, não pegar fila, prioridade na tramitação de ações, e por aí vai. Crianças e adolescentes: (ECA) não podem ser presas, mesmo matando roubando e fazendo o diabo. E veja bem, se alguém disser qualquer coisa que ofenda um adolescente (com 17 anos e 11 meses, o bicho pega). Deficientes físicos (existem várias leis federais e estaduais, inclusive aqui em alagoas) que os protege, assegurando-lhes dignidade, Quer ver uma coisa, bate num deficiente! Negros: Vá chamar alguém de negro! É crime de racismo e preconceito de cor. Tem que ser afro descendente, mas se o negro chamar o branco de “Branquelo”, não é crime nenhum. Cotas de vagas em concursos públicos e para ingresso em Universidades. Igrejas: não pagam impostos, diferentemente das demais instituições que são obrigadas a pagar. Devemos lembrar que Jesus pagou impostos e ainda orientou os apóstolos a pagar, no famoso “Daí a Cesar o que é de Cesar” Nesse caso ninguém que seguir a Bíblia. Políticos: Possuem imunidade parlamentar, não pode ser preso normalmente, e embora todo dia saia escândalos, eles não cometem roubo, e sim apenas “desvio de verbas” Juízes, não podem ser demitidos (por crime em razão da profissão) a pena máxima que podem pegar é ser aposentado com o salário integral, será que alguém contesta isso? e por aí vai.

Sinceramente, não vejo a igreja se levantar contra nada disso. Deixa os homossexuais pra lá, eles não terão direitos maiores que a maioria dos que já citei. A lei não é igual para todos. Não entendo por que essa guerra contra os homossexuais, parece que apenas eles não podem possuir direitos; e não se pode dizer que não necessitem. São mortos, ofendidos, descriminados, perseguidos e expropriados pelo fato de possuir uma orientação sexual diferente. Eu pergunto: isso é justo?

Tem a igreja o direito de continuar julgando as pessoas baseado apenas em suas convicções religiosas? O país não é uma igreja, as pessoas não são obrigadas a seguir a Bíblia, a não ser que aceitem livremente obedecer as orientações de alguma denominação cristã. Então, ou a gente combate tudo, ou deixa que a sociedade se organize com base em leis civis que proteja a todos, independente de credo religioso, cor, idade, posição social, ou qualquer que seja a razão.

Quero lembrar que os negros só passaram a ser respeitados como pessoas, mesmo com a fim da escravidão, depois que o racismo foi criminalizado (e a Bíblia oferece base para considerar que não possuíam direitos, já que foram amaldiçoados por Deus). Acho estranho que muitos negros critiquem a busca dos homossexuais por seus direitos.

A mulher só passou a ter um pouco de dignidade depois que se criminalizou a prática de bater nelas pelo fato do agressor ser o marido, namorado, ou simplesmente mais forte. E muita gente que critica o direito dos homossexuais são mulheres que desfruta de direitos que apenas elas possuem.

Muita gente que se coloca na linha de frente para combater a PL 122, aproveita os direitos concedidos aos idosos, aos deficientes, às suas crianças, igrejas que levantam bandeiras contra a homofobia, se apegam aos direitos adquiridos, muito embora muita gente os utilize para enriquecer sem pagar impostos.

Não se está dizendo que os problemas acabaram, mas pelo menos há um amparo jurídico para punir os infratores. Creio para que se possa viver em sociedade é necessário garantir que todos vivam com dignidade, desde que suas ações não causem danos aos outros. Não vejo como o direito dos homos represente ameaça aos héteros. Temos que nos lembrar que o Brasil não é um país feito apenas de héteros, querendo ou não ele é feito de heterossexuais e de homossexuais que precisam ser respeitados como cidadãos. Como igreja, deveríamos ser os primeiros a defender a vida e a dignidade dessas pessoas. Vamos parar com essa tendência de colocar a fé acima do amor, a Bíblia recomenda amar a todos e não faz exceção. Vamos deixar de julgar e condenar as pessoas, se elas estiverem erradas, prestarão contas a Deus. (A Bíblia é taxativa não julgueis e não sereis julgados) Se queremos obedecer a Bíblia, antes de sair por aí caçando homossexuais, lésbicas, e seus congêneres, devemos nos lembrar da orientação que ensina a não julgar nem condenar ninguém.

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