A idéia do encanto permeia o imaginário coletivo da raça humana, talvez uma espécie de neurose primitiva, uma fantasia retardada que existe em todos nós. Desde cedo ouvimos falar de floresta encantada, reinos encantados, animais e princesas que vivem em castelos encantadas; príncipes que subsistem em forma de sapos e que são desencantados com o beijo da princesa amada; fadas madrinhas que realizam sonhos, duendes, elfos, bruxas, magia, feitiços, mistérios e segredos milenares. Basta uma história que envolva a idéia do encanto e o sucesso é garantido. A priori, não há nada de errado com isso, afinal a fantasia cumpre um papel importante em nossa fase infantil; o problema é quando essas imagens e fantasias perduram na idade adulta, lançando o ser humano em um mundo povoado de seres encantados que jogam com o nosso destino e de certa forma passa a decidir a vida das pessoas aqui e agora.
Podemos dizer que o encanto do mundo se manifesta na crença de anjos, arcanjos, demônios, querubins, serafins e demais entidades que habitam o mundo religioso. A crença em tais seres nos coloca em contato com esse mundo mágico, repleto de segredos que desafiam a nossa imaginação. Somos seduzidos pela idéia de que para além da realidade visível, existe um mundo encantado, de seres invisíveis que apesar de não vermos são reais. Viver nesse mundo irreal é deixar de viver a realidade com todas as suas implicações, é viver em mundo de quimeras.
Reconheço não ser fácil quebrar esse encanto, ele exerce fascínio sobre todos nós, de forma que muitas vezes é preferível viver num mundo ilusório a encarar a realidade. Despovoar o mundo dos seres encantados que criamos é uma tarefa que exige muito esforço de cada um de nós. Quebrar o encanto do mundo é adquirir uma visão adulta da realidade e deixar a fantasia do encanto para o universo infantil; só assim, poderemos desfrutar a delícia de viver o verdadeiro encanto de apreciar o mundo com toda sua beleza, sabores e magia. De gozar os prazeres que a vida nos oferece e desprezamos passando a viver prisioneiros de nossos castelos assombrados pelas bruxas que habitam em nosso inconsciente.
Em outras palavras se quisermos viver encantado com mundo precisamos ter coragem e determinação para deixar o mundo encantado.